sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Alta carga tributária é principal entrave para expansão do consumo de vinhos

Que o vinho é bom para o paladar e para a saúde, ninguém nega. É possível listar diversas razões pelas quais a bebida deveria fazer parte do dia a dia, seja para acompanhar uma refeição, seja para promover mais qualidade de vida. Contudo, nem todos os adjetivos associados ao vinho têm sido capazes de estimular um aumento de consumo no Brasil: nos últimos 10 anos o consumo per capta passou dos módicos 1,8 litros/ano para os atuais, e igualmente pífios, 2 litros. Mais do que os desafios culturais, o setor sofre com a constante alta de impostos – o último, há cerca de um ano, mudou a forma de tributação e tornou rótulos já caros, ainda mais custosos. Num país onde o preço está equivocadamente associado à qualidade do vinho, a alta carga tributária é, indiscutivelmente, um dos maiores entraves para a popularização da bebida e expansão do consumo qualificado.
 
Impostos em alta – consumo em baixa
 
O consumo brasileiro se torna ainda mais modesto se comparado com países vizinhos: chilenos e argentinos consomem anualmente de 8 a 10 vezes mais litros da bebida. Esses fatores não estão ligados exclusivamente às preferências do consumidor nacional: países asiáticos com pouca tradição no consumo e na cultura do vinho já apresentam números mais expressivos do que o Brasil, que possui uma indústria sólida e regiões como a Serra Gaúcha, de grande tradição vinícola.
 
Um dos maiores responsáveis por essa morosidade é a alta carga de impostos: no mercado brasileiro a composição do preço final do vinho é, em maior parte, formada por tributos. A mudança mais recente, proposta pela da Medida Provisória 690/2015 e transformada na Lei nº 13.241/2015 alterou o antigo modelo de alíquota de IPI que variada de R$ 0,73/litro para rótulos nacionais até US$ 70 para os importados. No novo modelo, em vigor desde dezembro de 2015, o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) incidente sobre a bebida passou a ser de 10% em relação ao preço do vinho.
 
E não para por aí: antes de chegar à mesa do brasileiro, diversas cifras são adicionadas ao custo final de uma garrafa e, quanto mais longo o caminho até o consumidor final, maior será a fatia direcionada ao governo. Números do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) apontam que somando ICMS, IPI, COFINS, PIS e ainda encargos relacionados à cadeia produtiva, 54.73% do preço do vinho nacional correspondem a impostos. Porém, se essa garrafa vem de outro país a proporção é ainda maior: até 74.73% do custo final de um vinho importado corresponde a tributos.
 
Entraves burocráticos
 
Tratando-se de rótulos estrangeiros, existem ainda dois itens que podem tornar o preço final ainda mais salgado: a complexidade e a demora do processo de importação. Para se ter uma ideia, antes de chegar às prateleiras, o importador deve considerar os custos de frete, armazenamento adequado e de liberação do produto na alfândega, o chamado desembaraço aduaneiro. Além disso, cada garrafa deve atender aos padrões de rotulagem nacionais e passar por uma análise química a cargo do Ministério da Agricultura, processo este que requer a retenção de algumas amostras de cada lote. Lembrando que boa parte desses processos estendem-se por longos períodos, aumentando os custos de importação. Ou seja, o produto já atraca no país com um custo elevado, antes mesmo de passar pelos encargos de comercialização.
 
Consumo qualificado
 
Não é a toa que o consumo brasileiro é composto, em geral, por vinhos de baixa qualidade, de acordo com dados do site especializado Ibravin, considerando-se apenas o consumo de vinho fino, a média per capta cai para apenas 0,7 litros/ano. De acordo com Stephanie Duchene, sommèliere que trabalha com rótulos artesanais importados da França, é essencial reorganizar o setor, mas também é importante estimular o consumo qualificado: “Não estamos falando apenas de quantidade, mas principalmente de qualidade. O consumidor brasileiro muitas vezes não se sente a vontade para se aventurar no mundo dos vinhos em virtude do pouco conhecimento. Porém, se estimularmos um consumo qualificado, no qual ele não precisa beber muito, mas sim conhecer vinhos de qualidade; permitindo que ele se identifique com a bebida que aprecia, certamente o vinho estará presente com mais frequência na sua mesa.” Para a fundadora da Wine Exclusive, é preciso que esse hábito faça parte do dia a dia do brasileiro “não apenas para aumentar a proporção de consumo anual, mas principalmente para que o consumidor tenha contato com bons vinhos. Quando falamos em consumo qualificado não estamos falando em beber muito, mas conhecer vinhos que realmente traduzam essa cultura tão rica.”. – conclui.
 
Vinho como alimento
 
Uma das saídas para estimular o consumo e, ao mesmo tempo, baixar os encargos seria alterar a classificação da bebida no país. Atualmente, o vinho entra na mesma classificação de bebidas alcoólicas ou de artigos de luxo, produtos que, devido sua natureza, sofrem sobretaxação. Contudo, a exemplo, países como Estados Unidos, Chile e França já categorizam a bebida como um alimento funcional em virtude dos benefícios que o consumo moderado pode trazer à saúde. No Brasil, tramita na Câmara dos Deputados desde 2013 o Projeto de Lei 5965/13, de autoria do deputado Edinho Bez (PMDB/SC), que propõe a inclusão do vinho na cesta básica e sua classificação como alimento, dessa forma seria possível reduzir impostos e estimular a produção nacional. Atualmente, o projeto aguarda apreciação da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural (CAPADR).
 
Contudo, enquanto mudanças como essa não vem, é preciso investir em conhecimento e apostar no consumo qualificado, principalmente na hora de escolher um rótulo estrangeiro. De acordo com Geoffrey Pompier, empreendedor do setor, neste caso, o consumidor deve optar por rótulos sem intermediários “Quanto menos intermediários houver entre o produtor e o consumidor, mais acessível será o preço da garrafa. Por isso, nem sempre comprar uma garrafa num supermercado é a opção mais barata. Além disso, a compra em locais especializados pode garantir mais qualidade em virtude da exclusividade do produto.”- conclui.

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